Perdemos chance de baratear crédito na Reforma Tributária, diz presidente da Febraban

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A Reforma Tributária sancionada no começo de 2025 está longe de ser uma unanimidade. E, para Isaac Sidney, presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), foi uma chance perdida de tirar o peso tributário sobre as intermediações financeiras o que teria um impacto direto para os consumidores: a redução do custo de crédito. “Uma das causas do elevado custo de crédito no Brasil é o custo de intermediação”, diz Sidney , ao InfoMoney Entrevista.

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De acordo com o presidente da Febraban, a cada R$ 100 que o brasileiro paga de spread bancário, R$ 80 se destinam para custo da intermediação financeira, como o de captação, da inadimplência ou da carga tributária que incide na receita com intermediação financeira. “Somos um dos cinco países do mundo que incide tributo na intermediação financeira e perdemos uma grande chance na reforma tributária de tirar esse peso”, afirma. “Mas o Brasil é assim: complexo, difícil e com passo de cada vez”.

Leia os principais trechos da entrevista abaixo:

InfoMoney: O país vive em um cenário de juros altos há bastante tempo e a perspectiva é de que isso continue. De que forma isso impacta o setor bancário?

Isaac Sidney: Tem um impacto direto, sobretudo nas taxas de juros e no spread bancário. Mas acho que vale a pena dar alguns passos atrás. O Brasil, historicamente, mantém níveis elevados de juros, especialmente os juros básicos da economia, e isso repercute no mercado de crédito. Precisamos entender as causas que fazem com que os juros no Brasil sejam altos. Temos um desequilíbrio macroeconômico, principalmente nas finanças públicas, que faz com que o Estado precise emitir dívida e arrecadar mais. A carga tributária também pesa. Estruturalmente, o Brasil ainda não conseguiu se alinhar a outras geografias que têm juros mais baixos. Conjunturalmente, estamos enfrentando uma inflação que está 2,5 pontos percentuais acima da meta de 3%. O Banco Central tem aplicado um remédio amargo, ainda que a contragosto, para desaquecer a economia, o que exige um patamar mais elevado de juros.

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InfoMoney: E a perspectiva é que os juros se mantenham neste patamar elevado por um bom tempo?

Sidney: Sim, eu acho que temos uma perspectiva baixa de o Banco Central a reduzir esse elevado patamar. Se tivermos algum equilíbrio a mais das contas públicas, um pouco menos de despesas e de gastos públicos, é provável que o Banco Central termine o ano a iniciando — ainda que de forma muito gradual — uma toada de redução da taxa de juros. Não é o cenário base com o qual nós estamos trabalhando. Eu acho que a gente termina 2025 com uma taxa SELIC bem próxima de 15%.

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InfoMoney: O crescimento econômico tem surpreendido, mesmo nesse cenário. Como o senhor observa o mercado de crédito dentro desse movimento?

Sidney: De fato, a atividade econômica vem surpreendendo para cima, contrariando as previsões do mercado. Estamos no quarto ano seguido de crescimento, o que demonstra uma resiliência em meio a várias adversidades. O mercado de crédito tem sido uma alavanca importante, com crescimento de 11,5% em 2024 e projeção de 9% para 2025. Isso mostra que a concessão de crédito está fomentando a atividade econômica, embora já vejamos o impacto da Selic no apetite dos bancos para ofertar crédito.

InfoMoney: Sobre uma parte específica do crédito, financiamento imobiliário, o Banco Central tem discutido alternativas para essa área. Como a Febraban tem participado dessas discussões?

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Sidney: Estamos inseridos em um grupo de trabalho criado pelo Ministério da Fazenda, que conta com a participação do Banco Central. A discussão gira em torno das fontes de recurso para o crédito imobiliário, que atualmente está em torno de R$ 1,2 trilhões. Há uma necessidade urgente de alternativas para que esse funding possa continuar. Uma das propostas é permitir que os bancos negociem suas carteiras de crédito imobiliário no mercado secundário, aliviando seus balanços e liberando capital para novos empréstimos. Mas essa é uma discussão complexa, que envolve, inclusive, o apetite que o mercado de capitais pelo mercado secundário poderia ter para adquirir essas carteiras. Neste caso, um fator fundamental é preço, como acontece em qualquer mercado.

Isaac Sidney, presidente da Febraban, é o convidado do InfoMoney Entrevistado desta semana (Foto: InfoMoney)

InfoMoney: O Brasil é visto como um exemplo de inovação no setor bancário no mundo. Quais são os próximos focos de inovação para o setor?

Sidney: O Brasil tem se destacado em inovação, especialmente com o Pix e o Open Finance. Estamos exportando tecnologia e modernizando nosso sistema financeiro. A pandemia acelerou esse processo, e temos um ecossistema em que os clientes podem compartilhar seus dados de forma segura, permitindo uma personalização maior nos serviços. E a inteligência artificial é uma das principais frentes de investimento de inovação. Estamos usando essa tecnologia para modelagens de análise de risco de crédito, detecção de fraudes e ofertas personalizadas para clientes. A personalização é fundamental no relacionamento com o cliente, e a IA nos ajuda a entender melhor suas necessidades.

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InfoMoney: O crédito é uma alavanca importante para a economia do Brasil, mas ele continua muito caro. Há caminhos para mudar isso?

Sidney: A cada R$ 100 que pagamos de spread bancário, R$80 se destinam para custo da intermediação financeira, como o custo de captação, da inadimplência ou da carga tributária que incide na receita com intermediação financeira. Por isso, se, hoje, os bancos resolvessem conceder crédito com rentabilidade zero, nós teríamos 80% de custo de intermediação. O Brasil precisa a entender qual é o mercado de crédito que queremos ter. Hoje, a carteira de crédito no Brasil equivale a 55% do PIB. Nosso vizinho, Chile, 100% do PIB. Na Europa é 150% do PIB e, nos Estados Unidos, é 200% do PIB.

Do Plano Real para cá, já dobramos a proporção da carteira em relação ao PIB, mas ainda temos muito espaço para crescer. Para o crédito se expandir, tem que ser barateado. Para baratear, temos que entender quais são as causas que fazem com que o spread e as taxas de juros sejam altas. Uma das causas é o elevado custo de intermediação. Somos um dos cinco países do mundo que incide tributo na intermediação financeira e perdemos uma grande chance na reforma tributária de tirar esse peso. Mas o Brasil é assim: complexo, difícil e com passo de cada vez.

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